Kiske
Animado e Longe de Polêmicas
Por Ricardo Batalha
Quando o vocalista Michael Kiske demonstrou vontade de voltar de vez ao mundo da música pesada, poucos imaginavam que poderia montar uma banda com tantos músicos de renome. No entanto o ex- não só se uniu a Mandy Meyer (guitarra, Krokus, Gotthard e Cobra), Dennis Ward (baixo, Pink Cream 69) e Kosta Zafiriou (bateria, Pink Cream 69), como recentemente anunciou Kai Hansen (guitarra Gamma Ray, ex- ) como integrante permanente do Unisonic. Além dos trabalhos com o Place Vendome, com a cantora Amanda Somerville e com o projeto Avantasia, de Tobias Sammet (Edguy), com o qual visitou o Brasil pela primeira vez em sua trajetória. Na entrevista a seguir, Kiske dá uma geral no que está acontecendo em sua carreira, conta algumas passagens interessantes sobre o seu passado e comenta a tão falada polêmica em relação a gostar ou não de Heavy Metal.
Como foi a sua primeira visita ao Brasil?
Michael Kiske: Eu gostei muito e finalmente pude comprovar o que todos falavam sobre o
público. Nunca tinha estado na América do Sul e agora eu sei da paixão de todos pela música. Além disso, eu não fazia turnês há mais de 17 anos, e só voltei aos palcos no ano passado. Gostei muito de estar no Brasil, na Argentina e no México. Pena que foi muito pouco. Estamos planejando algo maior no ano que vem com o Avantasia.
Quando você efetivamente sentiu que queria voltar aos palcos?Kiske: Isto foi em 2009, quando Dennis (Ward) e Kosta (Zafiriou), com quem eu havia trabalhado no Place Vendome, tiveram a ideia de criar uma nova banda. Senti que era a hora, porque mesmo tendo recebido convites ao longo dos anos, eu não queria sair em turnês e fazer coisas desse tipo. Tinha ficado frustrado e de saco cheio, por isso precisei de alguns anos para sentir novamente aquela vontade de estar no palco. Não me
arrependo de nada e no ano passado senti uma excelente vibração quando fizemos shows em festivais, como o 'Sweden Rock'. Eu estava um pouco ansioso antes dos primeiros shows, devo confessar. A adrenalina estava em alta e foi difícil me controlar no começo, mas depois do “Sweden Rock” voltei a me sentir confortável. É como andar de
bicicleta, você não esquece.
Acho uma tremenda coincidência você estar tocando com dois músicos do
Pink Cream 69, justamente o grupo de onde o Helloween pegou o vocalista Andi Deris...Kiske: É verdade (risos)
. Bem, a banda é muito boa e eles são ótimos músicos. Além
disso, eu não queria mais fazer tudo sozinho. Queria estar em uma banda, fazer parte daquilo. Achei muito legal voltar a trabalhar assim, colocando minhas ideias em cima do que os outros criaram e eles dando sugestões naquilo que eu fiz. No Unisonic não há
limites e isso me deixa animado. Se quisermos fazer um som mais pesado ou leve, tudo bem.
Por que você não quis ser identificado quando foi convidado por Tobias Sammet para participar do primeiro álbum do Avantasia?Kiske: Agora eu acho isso engraçado, mas até então eu vivia uma fase em que estava
de saco cheio de tudo no meio da música. Tinha passado por algumas experiências não muito boas com algumas pessoas no meu passado com o
. Estava de certa forma me escondendo e não sei dizer ao certo o porquê de não querer ter meu nome divulgado. Gosto de Tobi e quando ele entrou em contato comigo eu até pensei em não
participar, porque realmente não estava fazendo nada nessa área. Só havia feito algo com o Gamma Ray no álbum
Land Of The Free, na música
Time To Break Free. Hoje eu me orgulho de participar de um projeto como o Avantasia, mas naquela época eu queria me esconder.
E foi então que começaram aquelas polêmicas de que você odiava Heavy Metal e não queria mais estar neste meio.
Kiske: Nunca disse que odiava Heavy Metal. E ainda curto muito os discos que
cresci ouvindo, como os de Judas Priest, Iron Maiden, Ozzy Osbourne, Dio e Metallica. Gosto de Metal, de Rock e eu disse que tive certa rejeição àquele tipo de Metal que idolatra somente o mal. Disso até hoje eu não gosto.
Acredito que a interpretação das pessoas foi errada, porque é bem diferente você dizer que odeia Metal e de ser mente aberta e gostar de outros tipo de de música...Kiske: Claro, e isso é assim desde meus tempos de adolescência, quando eu curtia
demais essas bandas que citei. Ao mesmo tempo em que poderia ouvir Kill 'Em All, Ride The Lightining e Master Of Puppets, ouvia U2, Eurythmics, Kate Bush, Pat Benatar, Elvis Presley, Beatles e até Simon & Garfunkel. Nunca tive este fascismo da música, algo como 'só isso é bom e se você não escuta, é um otário'. Na realidade, eu acredito em coisas boas e a vida tem suas coisas boas. Veja, sou cristão, acredito em cristo e, apesar de não gostar
da igreja e de não frequentar nenhuma, acredito no significado espiritual da vida, em pessoas de bom coração, na verdade, na amizade e em tudo que faz da vida algo precioso. O que eu sempre disse é que no meio do metal existem coisas que levam para o outro
lado.
E não daria para abstrair isso ao invés de se
esconder do público?
Kiske:
Veja,
foi uma fase. Agora eu sinto coisas boa novamente neste contato com o
público, seja com o Avantasia ou com o Unisonic. Realmente eu estava
com uma impressão errada e tinha generalizado na minha mente algo
que a grande maioria dos que estão no metal não são. Ao menos
todos os que compareceram aos nossos shows são pessoas normais que
curtem Rock. E muitos deles nem eram nascidos ou eram muito pequenos
quando eu estava no Helloween (risos). Eu achava que toda essa
porcaria de adorar o mal era muito maior do que realmente é no meio
do metal. É por isso que me sinto muito melhor agora. Na música o
que importa é aquilo que você faz do coração. Se alguém gosta de
Country e toca este estilo do coração, está fazendo arte. Não tem
como você chegar e falar que é uma porcaria porque não está
tocando Metal. Esse é um pensamento idiota. Não importa o estilo
musica, o importante é a honestidade. Conheço gente desonesta no
metal, pessoas honestas que tocam Pop e vice-versa.
E como foi voltar a se apresentar ao lado de Kai
Hansen?
Kiske:
Eu
e Kai sempre fomos grandes amigos e no Unisonic nós já vínhamos
tocando A
Little Time e
Kids
Of The Century .
Eu e Kai nunca tivemos problemas no passado, só ficamos afastados
por um tempo. Portanto, podem esperar que tocaremos novamente coisas
como Future
World
e I
Want Out ,
que tanto os fãs pedem. Veja, se você juntar todo o material que eu
e Kai compusemos para os dois Keeper
Of The Seven Keys,
verá que temos uma grande quantidade de músicas para apresentar.
Quando nos vimos e passamos a trabalhar juntos, instantaneamente
sentimos a magia de volta. Afora isso, como há amizade, nos
divertimos muito fora dos palcos, também.
Outro trabalho interessante rm que você se envolveu
mais recentemente foi ao lado de Amanda Somerville. Como se deu essa
parceria?
Kiske:
A
primeira ideia veio através do dono da gravadora Frontiers, Serafino
Perugino, que tinha pensado em um disco comigo r uma cantora
dividindo os vocais. Achei interessante e então ele começou a
procurar pelas cantoras. Amanda era a segunda da lista que eles
tinham e eu nem a conhecia. Mesmo tendo feito algo juntos no projeto
Aina, eu não a conhecia, porque nem cheguei a ler o encarte. Eu
sabia como era a voz dela, mas nem sabia que era de Amanda. No ano
passado, quando fomos gravar o vídeo, eu finalmente a conheci.
Como você e ela dividiram os vocais? Foi tudo
pensado ou feito no improviso, tentando equalizar o que ficou mais
interessante em cada parte?
Kiske:
Não
planejamos muito. Matt Sinner, que produziu o álbum, dava sugestões
do que fazer em certas partes. Também pensamos no que combinava com
as letras. Às vezes, ele me dizia para cantar os vocais principais,
mas eu achava que a voz de Amanda tinha ficado mais legal e então
somente harmonizava as linhas. Eu sempre gostei de mulheres cantando,
seja no metal ou não. Nem me importa o estilo, pois escuto Martina
McBride, Faith Hill e, como disse entes, Pat Benatar, Kate Bush e
Annie Lennox com o Eurythmics. Ouço até Tayloe Swift, acredite ou
não. No Metal, não sei se a coisa aumentou com o Nightwish e
Evanescence, mas parece que isso encorajou as garotas a cantar.
A experiência parece ter sido positiva. Existe a
chance de outro álbum com Amanda Somerville?
Kiske:
Tenho
certeza que sim. Serafino até queria que saíssemos em turnê. O
conceito funcionou, eu gostei dela como pessoa e como cantora e é
certeza que voltaremos a trabalhar juntos. Talvez mais tarde, porque
agora é hora de pensar no Unisonic.
Por falar nisso, por qu você decidiu criar o
Unisonic, ao invés de continuar com o Place Vendome?
Kiske:
Como
disse, eu não queria comandar tudo sozinho. Eu queria estar em uma
banda de verdade, com todos opinando. E temos Dennis Ward, que
trabalhou com o Place Vendome e é um cara extremamente talentoso. Eu
sempre compus pensando na simplicidade, mas quando você passa suas
ideias e suas composições para um cara como Dennis Ward ele tem a
capacidade de dar outra visão, alterar arranjos e transformá-la. É
isso que curto em estar em uma banda, pois nos tempos do Helloween
era assim. Eu levava minhas músicas à sala de ensaio e a banda
acaba deixando-a com o estilo pelo qual o Helloween ficou conhecido.
A carreira solo ficará de lado agora com o Unisonic
ou você pretende gravar um novo álbum solo?
Kiske:
Claro
que sim. Na verdade eu até tenho que lançar, por contrato. Não sou
tão rápido para compor, mas com a ajuda do guitarrista Sandro
Giampietro as coisas ficarão mais fáceis. Claro que estou animado
também com o primeiro álbum do Unisonic.
Como será este álbum musicalmente? Será um rock
mais simples, Heavy Metal ou mais próximo ao som do Place Vendome?
Kiske:
Não queremos soar como o Place Vendome e não nos consideramos Heavy
Metal, ainda que existam músicas nessa linha. Preferimos falar que
tocamos Rock. O Unisonic é uma banda de Rock. È difícil dizer como
vai soar, mas qualquer pessoa que curte o Place Vendome também vai
gostar. Só não será tão ligado aos anos 80 e nem tão polido. Não
queremos soar como AOR, mas como um Hard Rock mais puro.
Você
lançou seu primeiro álbum solo, Instant
Clarity
em 1996, logo após deixar o Helloween. Quais são as suas lembranças
daquele trabalho de estréia?
Kiske:
Veja,
Instant
Clarity
foi a minha primeira tentativa de fazer um disco sozinho. Claro que
tive ajuda, como a de Adrian Smith, que não estava no Maiden naquela
época. Rod Smallwood era meu manager e teve a ideia de me colocar em
contato com Adrian. Nós nos reunimos e fizemos muitas coisas legais.
Como
a música New Horizons ,
por exemplo...
Kiske:
Sim,
essa música é perfeita para exemplificar minha união com Adrian
Smith e Kai Hansen. A ideia básica foi de Adrian, eu criei as
melodias de voz e Kai foi adicionando alguns elementos de guitarra e
solos.
Neste
álbum ainda há a faixa Always,
que é um tributo para o falecido Ingo Schwichtenberg.
Kiske:
Quando
eu compus essa música, estava meio pra baixo e frustrado, e decidi
dedicá-la a ele. Não fazia muito tempo que ele havia partido e
pensei que ela combinaria mais com ele do que comigo. Ele perdeu a
batalha e ela reflete bem mais a vida dele do que a minha. E Ingo era
uma pessoa muito legal, honesta e tinha um bom coração. Ele apenas
ficava sem controle, bebia muito. Quando tivemos problemas com a
Noise Records, ele simplesmente partiu para uma jornada suicida,
começou a beber demais e entrou no meio de drogas pesadas. Foi uma
coisa muito triste.
Falando
sobre seu segundo álbum solo, Readiness
To Sacrifice, a
aceitação não foi tão boa em relação a Instant
Clarity.
A que você credita isso?
Kiske:
Simples: porque esperavam que eu fosse fazer um som como o Helloween
e eu não fiz. E não estava querendo contentar um mercado especial,
mas apenas compondo e me expressando. Seria ridículo se tentasse
ficar soando sozinho como o Helloween. É por isso que fiquei tão
puto da vida com essas coisas. Veja, quando estou compondo com o Kai,
a música vai naturalmente para esse lado. Não seria uma coisa
falsa, porque ele compõe de um jeito que me faz cantar de certa
maneira que fica com a cara de que era o Helloween. É automático
ter aquela vibração. E se tirarmos isso, também será ridículo,
porque juntos soamos assim. E eu sozinho, não. Não quero copiar
algo só porque fez sucesso. Não seria verdadeiro. Muitos querem
ouvir sempre as mesmas coisas, não gostam de algo inesperado.
Acredito
que é por isso que muitos até criticam o álbum Chameleon
(1993), seu último com o Helloween...
Kiske:
É
engraçado...Eu não gosto muito do Chemeleon,
mas porque me faz lembrar uma fase ruim. Mas foi um disco verdadeiro,
honesto. Ocorre que Ingo estava passando por um péssimo período e a
banda não estva unida. Quando Ingo finalizou as partes da bateria,
ele sofreu um colapso e aquele foi o início do fim. Meus discos
favoritos são os Keepers...,
mas pela criatividade e porque estávamos funcionando bem enquanto
banda. Foi a melhor fase da minha vida numa banda, criando e fazendo
turnês. Mesmo assim, em Chameleon
eu compus algumas músicas de que me orgulho muito, como I
Believe
e
Longing.
Hoje em dia, eu sei que pelo lado comercial nós mudamos uma fórmula
que fazia sucesso. Fazia e faz sucesso até hoje, o que acho
incrível. Só que a mudança já vinha sendo natural, pois vínhamos
de Pink
Bubles Go Ape
e as pessoas precisavam ver que Kai Hansen também não estava mais
na banda.
Como
você analisa o álbum Past In
Differents Ways,
que traz versões para músicas do Helloween?
Kiske:
Fiquei
muito contente por tê-lo feito, porque foi como passar por cima de
todos os sentimentos ruins dos tempos do Helloween. No começo eu até
me recusei a fazê-lo, mas depois de alguns dias pensei:'Porque
rejeitar minha própria música?' Era estúpido. Mas eu fiz algo
inesperado, que foram as versões acústicas, que foram as versões
acústicas. Acho que as pessoas deveriam mais abrir mais a mente e
entender o que um disco apresenta de bom e não apenas dizer o que
ele não é. O que importa é o que é! Ouça e curta. É apenas um
disco, depois haverá outro.
Colaborou
Thiago Rahal Mauro